O recente questionamento feito pelos filhos do jornalista Cid Moreira sobre supostas irregularidades nas assinaturas em seu testamento trouxe à tona um tema sensível e recorrente no Judiciário: a falsificação de documentos que definem a partilha de bens após a morte. O caso levanta dúvidas sobre como a Justiça trata situações em que há indícios de fraude e manipulação patrimonial. De acordo com a advogada Danielle Biazi, sócia do escritório Biazi Advogados Associados e doutora em Direito Civil pela PUC/SP, a falsificação de assinaturas em testamentos tem duas principais repercussões. “A primeira é criminal, a segunda é no âmbito cível, com a anulação do ato de disposição de última vontade. Neste contexto, se for invalidada a deixa testamentária, todas manifestações ali existentes jamais produzirão efeitos e a sucessão ocorrerá a partir da regra geral do Código Civil, portanto, observando-se os quinhões a partir do que consta na ordem de vocação hereditária prevista no artigo 1.829”, explica.
Mesmo em um cenário em que não haja a evidência de falsificação das assinaturas, um testamento pode, de fato, ser anulado. “Todo testamento pode ser objeto de anulação judicial, desde que haja fundamento jurídico para tanto. A falsificação da assinatura do testador é apenas uma das hipóteses de nulidade”, afirma Caio Almeida, advogado do Ambiel Bonilha Advogados e especialista em Direito de Família e Sucessões.
Conforme aponta o especialista, o Código Civil prevê outras situações, como, por exemplo, a ausência de capacidade mental do testador no momento da lavratura (art. 1.860 do Código Civil) e a existência de vícios de consentimento, como coação, dolo ou erro, ou até o descumprimento das formalidades legais próprias de cada espécie de testamento. “Nessas hipóteses, ainda que a assinatura seja autêntica, os herdeiros prejudicados podem requerer judicialmente a anulação do testamento”, acrescenta.
Importância do planejamento patrimonial em testamentos
O episódio do testamento de Cid Moreira reforça também a importância de cuidados preventivos para evitar disputas familiares. “O testamento é uma excelente ferramenta de planejamento patrimonial e sucessório e cada vez mais é utilizado no Brasil”, afirma Biazi.
Por este documento, toda pessoa que tiver herdeiros legítimos terá a liberdade para testar sobre até 50% do seu patrimônio como preferir, resguardada a outra metade aos sucessores necessários – como, por exemplo, filhos e cônjuge. “Também pelo testamento, a parte poderá indicar formas de uso de determinados bens, indicar proporções e até mesmo o que deverá ser destinado a qual dos herdeiros testamentários, inserir cláusulas restritivas como a incomunicabilidade de bens entre cônjuges, determinar a inserção de certos direitos reais ou constituições de renda. São inúmeras as possibilidades que atenderão as demandas de cada indivíduo e sua realidade familiar”, orienta a advogada.
Para garantir a segurança do ato, é indicado que sua confecção seja feita nos estritos ditames do que a lei prevê e, sempre que possível, pela forma pública (ou seja, perante um cartório). “Ainda, caso o testador seja pessoa idosa ou questões relacionadas a sua sanidade mental possam ser levantadas, é aconselhável que ao tempo da lavratura, apresente laudo médico quanto a sua lucidez e solicite ao tabelião que faça constar os dados de tal documento, bem como do médico declarante na escritura”, conclui Biazi, ressaltando que, por regra, os tabeliães fazem sempre uma entrevista com o testador.