Como mãe de primeira viagem de uma menininha com menos de 1 ano, eu estava em dúvida se assistir Adolescência seria apenas um passatempo leve ou uma experiência mais dolorosa. Acabei decidindo assistir, principalmente motivada pelos diversos comentários nas redes sociais sobre a técnica de filmagem em plano sequência, e também porque sou fã de séries inglesas. Depois de assistir à série, percebi que ela se trata de uma daquelas produções que provocam discussões importantes. Pesquisando sobre as repercussões no Reino Unido, observei que muitas das conversas em torno da série abordam a questão da masculinidade tóxica, com algumas poucas se concentrando na “epidemia” dos rompantes de raiva que afeta os meninos e adolescentes da chamada Geração Ansiosa.
Como educadora, honestamente, essa foi a parte que menos me impactou. O que me chocou profundamente foi a falta de letramento que eu, e muitos outros educadores, temos em relação à linguagem que essa geração está utilizando nas redes sociais. Já existem vários artigos que sensacionalizam o uso dos emojis e o conflito geracional mostrado na série. No entanto, ainda somos incapazes de identificar mensagens de amizade, bullying, e até mesmo apologia ao crime e ao uso de drogas. Somos espectadores desinformados de uma geração que precisa de ajuda, mas não sabemos como oferecer essa ajuda de forma eficaz.
Como conseguir monitorar todos os fóruns em que nossos adolescentes interagem, e como estão interagindo, e conseguir entender a língua dessas múltiplas redes sociais? E qual o papel das instituições de ensino nesse contexto? Posso me estender aqui sobre como é importante estarmos ainda mais próximos e criar mais conexão com nossos alunos para que confiem em nós quando precisarem de ajuda. Mas infelizmente, isso não é suficiente, pois precisamos nos antecipar aos perigos que esses jovens estão expostos nas redes: discursos de ódio, grupos planejando ataques terroristas e ações violentas, pornografia infantil, pedofilia, bullying. Os pais não estão prontos para sozinhos, monitorar esse tipo de ação. Mas, isso é responsabilidade das escolas?
As crianças estão passando cada vez mais tempo na escola, e mesmo com a proibição dos celulares nas salas de aulas, os jovens continuam a utilizar as redes sociais fora do ambiente escolar. Assim, é necessário refletir sobre a necessidade do letramento digital daqueles que estão em contato com esses alunos diariamente: professores, orientadores, psicólogos, etc. As famílias não estão prontas e tampouco estão as escolas. Estamos todos nos sentindo como o personagem policial de Adolescência, que vagava sem pistas conversando com os alunos, até que seu filho lhe deu uma aula sobre o estado mental do protagonista da série, que sofria bullying abertamente no Instagram, e nenhum adulto do seu círculo sequer suspeitava.
Para orientá-los a usar as ferramentas digitais de maneira segura, responsável e crítica, precisamos saber o que fazem no Discord, no Reddit, no Instagram, no TikTok, e que tipo de mídia e algoritmo cada plataforma utiliza. Isso não significa que os professores precisam ser especialistas em todas as tecnologias, mas sim que devem possuir um nível de conhecimento que os permita mediar discussões e interações digitais de maneira crítica e informada, ensinando os alunos a reconhecerem os riscos, e a desenvolverem habilidades para lidar com a pressão social, cyberbullying, como reagir se abordados de forma imprópria nas redes.
Portanto, o letramento digital deve ser encarado como uma parte integrante do currículo escolar, e para isso, precisamos de celular e computador dentro de sala de aula, com intencionalidade. A lei que baniu o uso de celulares dentro das escolas é necessária, mas prega que sejam usados com moderação e com intencionalidade pedagógica. Ainda estamos distantes disso, com professores precisando de formação continuada e amparo na decisão de como e quando inserir os devices em sala.
Em resumo, a escola tem um papel vital no controle da atividade digital dos jovens, mas esse papel não deve ser isolado. Deve ser parte de um esforço conjunto com os pais e com a sociedade, criando uma rede de apoio que promova o bem-estar digital dos adolescentes. A chave está em equilibrar a vigilância necessária com a formação desses jovens a desenvolverem habilidades críticas para navegar de forma segura e saudável no mundo digital.
**Marina Dalbem é CO-CEO do Edify Education
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