No Brasil e no mundo, as discussões sobre a produção de alimentos colocam as práticas sustentáveis no centro das atenções. Agora, na cadeia da soja, esses debates ganham uma nova liderança com a ascensão de Luiza Bruscato, a mais nova presidente da Associação Internacional de Soja Responsável (RTRS), sediada em Zurique, Suíça.
Luiza, aos 36 anos, não apenas se torna a primeira mulher a comandar a entidade, mas também a primeira brasileira e a pessoa mais jovem a ocupar esse cargo de destaque. Desde janeiro, quando assumiu a presidência, ela tem liderado a discussão sobre as certificações de boas práticas no cultivo do grão e a crescente importância da sustentabilidade como um impulsionador de receita para os produtores rurais.
Em entrevista exclusiva ao Globo Rural, Luiza Bruscato compartilhou suas visões e planos para a RTRS, delineando como a preocupação com a sustentabilidade está se transformando em uma força motriz para toda a indústria agrícola.
A presidente da RTRS começou falando sobre a evolução do mercado de soja responsável nos últimos anos. “A produção de soja sustentável certificada pela RTRS tem tido um crescimento notável tanto no mundo quanto no Brasil”, afirmou Luiza Bruscato.
Em 2021, 4,6 milhões de toneladas de soja foram certificadas globalmente, com o Brasil contribuindo com 3,6 milhões de toneladas. No ano seguinte, o volume global certificado subiu para 7 milhões de toneladas, sendo 5,9 milhões de toneladas produzidas no Brasil. Luiza destacou que a demanda do mercado impulsiona a receptividade dos produtores às práticas sustentáveis, indicando um potencial de crescimento otimista. Tanto a soja quanto o milho têm como principais consumidores a indústria de nutrição animal.
Questionada se o volume de soja certificada no Brasil ser o suficiente para atender à demanda Europeia, Luiza deu uma resposta positiva: “Se considerarmos os volumes certificados disponíveis anualmente e o ritmo da procura europeia por soja certificada RTRS, os volumes disponíveis são suficientes para atender à procura”, afirmou. “Atualmente, o Brasil produz mais de 6 milhões de toneladas certificadas RTRS por ano, e a Europa compra 5 milhões de toneladas desse total. Essa realidade sugere que os volumes certificados disponíveis estão alinhados com a demanda europeia por soja certificada RTRS. Vale lembrar que a demanda europeia total por soja no ano é de 34 milhões de toneladas. O Brasil responde por 13 milhões de toneladas desse volume”.
Para completar, a nova líder da RTRS mencionou as vantagens para os produtores rurais ao terem soja certificada como responsável: “A primeira grande vantagem é que ele consegue acessar mercados mais sofisticados, que pagam melhor. E a segunda grande vantagem é que ele consegue vender não somente a soja física, mas também os créditos dessa soja sustentável. Temos hoje um mercado bastante interessante, em que as empresas compensam sua pegada de carbono com a compra desse crédito.”, disse.
Luiza ainda deu alguns detalhes sobre a certificação:
- A certificação da RTRS considera 108 indicadores de sustentabilidade ambiental, social e econômica, incluindo rastreabilidade.
- O processo de certificação ocorre em três etapas, permitindo que o produtor se adapte gradualmente às exigências estabelecidas.
- No Brasil, a RTRS possui uma parceria com a Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais) para auxiliar os produtores no processo de adequação aos indicadores de sustentabilidade.
- Além de certificar os produtores, a RTRS também certifica toda a cadeia de custódia, o que inclui plantas de processamento, portos que recebem a soja e espaços de armazenamento do grão.
Entretanto, o país ainda enfrenta desafios no que diz respeito a certificação e Luiza Bruscato explica o motivo: “Brasil é um dos principais mercados de soja sustentável. Temos 308 produtores certificados, em uma lista com agricultores individuais, produtores que têm várias fazendas e certificação em grupo, quando grupos de produtores ou associações se juntam. Um dos desafios de expansão é a existência da data de corte do desmatamento zero; quem não está dentro disso, não consegue se certificar”, destacou.
Por fim, ainda destaca um fator cultural: “Entre os gargalos estão ainda a dificuldade de comunicação, de fazer essa informação chegar ao produtor e o acesso a linhas de crédito que permitam ao produtor fazer as mudanças necessárias na fazenda. Também tem uma questão cultural. Tradicionalmente, nós não somos um país que tem o costume de certificar tudo, diferentemente dos Estados Unidos”.